sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Agora qualquer movimento levanta poeira que cobre tudo... desperta a linguagem das lágrimas.

Há emoções que curam... mas elas estão tão esquecidas, não fazem mais parte de minha vida. Eu sei que há uma relação do corpo com a alma... 'esteja bem em seu corpo e sua alma agradecerá e vice-versa também'.

Meu corpo... coitado, dilacerado se esforça em continuar. Mas percebo que estou perdendo a luta. E a alma sofre... ou é o contrário? Já não sei...

Tento apagar as lembranças, afogar as mémórias... pôr um fim na minha história. Desço as escadas devagar... tateando no escuro sinto-me sufocar... a dor, em média medida, desperta a criatividade... dor demais... dor em demasia... pura maldade.

A poeira é a culpada... não me deixa ver nada... nada com exatidão... escurece ainda mais minha escuridão.

Abro uma porta... depois dela há outra, e há outra e mais outra... indefinidamente, intermitentemente... ilimitadamente... portas que se abrem, portas que se fecham... nada depois delas, nem antes delas.

Uma chuva fina depois da última porta - até que enfim uma saída... lágrimas do céu... pra me fazer companhia. Estou tão só neste mundo despovoado... procuro por todo lado... a única resposta é a solidão... acompanhada da escuridão... 'só por toda a eternidade'... é o que os balões coloridos milimetricamente alinhados diante de mim trazem como mensagem de aniversário. E vão estourando um depois do outro.

Acordo assustada... toda suada.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

A maioria de nós é saudável a maior parte do tempo... saudável fisica, emocional, psicologicamente... a maior parte do tempo. Isso, acho eu, é normalidade.

 E o que acontece na menor parte do tempo para a maioria de nós? Somos insaudáveis... isso é, então, anormalidade.

E em que situação nos encontramos quando apenas uma parte de nós está saudável e as outras insaudáveis? Isso é possível? Não sinto nenhum mal-estar físico... então fisicamente estou saudável... mas o resto? O resto é uma ferida só.

Agora, pensando... minha incapacidade de dormir sem morfináceo, meu coração que só desacelera com propanolol... são sinais de que fisicamente não estou saudável? Mas, não há nada errado com meu coração - a não ser aquela dor no lugar onde ele se encontra... mas não é uma dor causada por uma disfunção do próprio coração...

Volto à normalidade da minha vida cotidiana antes de meu filho puf no ar. Mas volto diferente... há diferentes tipos de normalidade? E de anormalidade?

Meu Deus! O sol está alto no céu, o calor queima meu rosto e meus braços... cachorros que latem extraordinariamente alto... o parque cheio de crianças... onde estão as compras do supermercado?
Sim, sim... estão aqui do meu lado... como vim parar aqui?

Um tempo de normalidade... totalmente fora de mim... nenhum pensamento direcionado ao meu menininho... é a paz que eu quero. Mas, como faço pra viver uma vida normal neste mundo sem a voz do meu bebezinho?

Pego as sacolas e volto pra casa... antes de sair do parque, entrego uma sacola com biscoitos e frutas pro mendigo... que me olha com um ódio que penetra fundo em mim.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Um café tão silencioso, terminado com 'tenha um dia feliz'.

Um café sem troca de olhares, de palavras, de carinhos... um café bem quente tão frio.

Certo, vou me esforçar... só depende de mim, né? Reestabeler uma rotina: começo limpando a cozinha, organizo a geladeira... quase vazia. Vou para o quarto, arrumo a cama, dobro as roupas jogadas pelos cantos, separo a roupa suja, levo pra lavanderia... Em seguida, os banheiros... organizo tudo, troco as toalhas, levo as sujas para a lavanderia.

Acho que este foi o primeiro passo pra retomar a normalidade. Engulo seco. Normalidade, parece brincadeira. Me esforço pra continuar, preciso arrumar, organizar o exterior.

Supermercado é o próximo passo.

- Vamos, amor!? - falo pro meu querido amor.

Outro esforço tremendo. Amor... amor... amor. Acho que é isso que a mata a gente, tira pedaço, despedaça...

Meu marido me deixa próximo ao supermercado e vai para o trabalho. Um beijo de despedida. Engulo seco. Prendo as lágrimas dentro de mim.

Na rua sozinha olho tudo ao meu redor. Normalidade. As árvores na praça à minha frente, as flores, um casal empurrando um carrinho de bebê. Engulo seco, suspiro... um suspiro longo e profundo e seguro as lágrimas. Continuo andando e olhando o mundo que continua na sua normalidade.

Um mendigo deitado num banco da praça. Normalidade!? É este o mundo em que vivo. Em que seres humanos passando a noite ao relento é considerado normal.

Começo a duvidar do que seja normalidade.

Sento num banco e me deixo ficar, meus olhos viajam até o outro lado da praça... os balanços, escorregador, a caixa de areia, as gangorras descoloridos pelo sol. O parquinho precisa de mais cuidados.

Eu e o banco da praça. O mendigo e o banco da praça. Quem é o mais derrotado? Que é o mais infeliz? Quem chegou ao extremo do sofrimento?

'Cada um ao seu modo, cada um com sua dor é o mais infeliz', penso eu. Pra cada um seu sofrimento é o pior.

Levanto e sigo ao supermercado. Preciso retomar meu dia a dia. Outro passo: salão de beleza. O interior está estraçalhado, mas o exterior não precisa ficar assim.

domingo, 10 de agosto de 2014

Me distrair é disso que eu preciso pra tirar essa dor no lugar onde está o coração.

Lentamente vou entrando no mundo do sono... a paz vai tomando conta de mim, devagarinho.

O vento sopra forte, o barco balança no mar, meu corpo ignorando toda e qualquer atitude lógica se joga ao mar... as ondas volumosas, frias brincam com ele... sou um joguete jogado pra lá e pra cá, ao sabor do mar... salgado. Minha garganta arde, mas meus olhos ficam fixos em um ponto... é lá que quero, que devo chegar. Uma criança sorri e estende os braços em minha direção. Quero gritar: 'Espere! Espere!', mas não tenho tempo o corpinho, que se lançou na minha direção, é engulido pela imensidão do mar... não mais azul. Não há nada a fazer, deixo-me ser engolida também. Mas o mar... o mar não me quer e me devolve à superfície a cada tentativa minha de submergir...

... e eu me arrasto pra fora dos pesadelos que me assolam a noite toda, toda noite. Não há vento, não há mar, não há uma criança a me acenar... a dor no coração... tão forte... se espalha até o fim de mim.

O sol... preciso me distrair. Vou sair... preciso de um alívio, por um momento que seja, mas preciso... e irei atrás de um pouco de paz.

Tomo café com leite bem quente, como uma fatia de bolo de limão que a querida Larissa fez pra mim. Meu marido me acompanha... tomamos suco de laranja, comemos mamão e maçã. Terminamos o café com um prato de morangos... e com 'viva um dia feliz'.

Era assim... tenho de trazer de volta essa vida antes de enlouquecer de vez.

Saio... só pra me distrair.