domingo, 28 de setembro de 2014

Quando acordei de manhã meu marido já havia saído para trabalhar...

Meu sono deve ter sido repousante... minha mente parecia leve, como a leve claridade que passava por uma fresta da cortina. Fechei os olhos e me deixei ficar, queria voltar para o sono repousante e esquecedor. O sono não voltou...

Coloquei indecisa os pés pra fora da cama... devagar fui na direção do banheiro, abri o chuveiro e me enfiei embaixo dele... e fiquei, com o coração afogado, agora só queria afogar meu corpo.

Claro que não consegui... só uma idiota poderia pensar em se afogar no chuveiro. Se ao menos eu tivesse a coragem de deixar a banheira encher... De onde essa indecisão de continuar ou não? Odeio ficar entre a cruz e a espada... estar entre Cila e Caríbdis...

Tomei café e fui à delegacia de pessoas desaparecidas atrás de novas informações... embora não tinha esperança nenhuma de novidades - pra ficar preparada para o pior, decidi perder toda a esperança - ir até lá era reconfortante. As pessoas pareciam entender o que eu sentia melhor do que ninguém... não me julgavam - e eu podia ser eu mesma, com todo o meu desespero... e sempre tinham uma palavra de conforto... embora sempre viesse seguida de um 'não, não temos notícia de seu filho'... 'mas continuamos esperando, com fé'.

Fé!? Fé... 'move montanhas'... está escrito em algum lugar... eu moveria o mundo de lugar se pudesse te encontrar, filhinho... se pudesse ao  menos saber onde você está...

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Na casa de meus pais me portei dignamente. Quem me via não podia acreditar que eu estava quebrada por dentro.

Sorri, conversei, comi bolo de chocolate, tomei sorvete, uma taça de licor... os pasteizinhos de camarão saborosos...

Tenho me dado cada vez mais conta que dá muito bem pra fingir que se está bem. Pouca gente nota a diferença... só quem presta muita atenção na gente. E, na maior parte das vezes, as pessoas estão mais procupadas consigo mesmas...

Não, não quero dizer que minha família é egoísta. Meus pais são uns amores, sempre presentes, atentos, sempre demonstrando preocupação...

estou mesmo é falando de maneira geral...

Voltamos para casa bem tarde... procurei manter a conversa com o meu querido marido, abracei-o forte quando nos deitamos, fechei meus olhos, grudei meus lábios nos dele... eu precisava me sentir viva...

E... no fim... uma espessa escuridão fechou pouco a pouco carinhosamente seus braços em torno de mim.

sábado, 6 de setembro de 2014

Se ao menos a luz apagada e as cortinass cerradas mantivessema a realidade longe de mim... mas não adianta, aperto fortemente meus olhos... mas as imagens não desaparecem na escuridão, a dor não diminui no meu coração.

O olhar de ódio daquele mendigo... olhar de ódio, penetrante, que vai rasgando cada pedaço meu... eu queria areditar que o mundo é bonzinho, é feito de gente boazinha - que erra às vezes, machuca, engana, mente, rouba, mata, esculhamba com a vida dos outros - mas que no fim fica tudo bem, os erros,os pecados, os males ficam no passado... e uma primavera colorida e perfumada toma todo o espaço o tempo todo.... se torna presente, um presente no presente.

Um olhar de ódio é um olhar de morte.

Não há mais muito a matar em mim, desde que meu pequeninho foi roubado. Faço um esforço tremendo pra me manter em cima de minhas próprias pernas, pra não apenas inspirar oxigênio e expirar gás carbônico, mas é tão difícil.... é uma força monstro pra me mostrar bem. Estico os lábios, mas não sorrio.

De manhã bem cedinho, meu marido propôs de sairmos caminhar e correr um pouquinho. Comi uma fatia de mamão, tomei um suco verde, vesti um agasalho, coloquei meu tênis de corrida e saí... com ele.

Caminhamos silenciosamente por uns 5 minutinhos, e ele perguntou se eu achava que poderia correr. Acenei que sim com a cabeça.... e disse pro meu corpo: 'hey amiguinho acabou a moleza... vamos nos mexer'.

Corremos... equilibradamente... corre, caminha, corre, caminha, corre...

Já li que devemos correr em um lugar movimentado, um lugar onde encontramos outras pessoas correndo... isso motiva.

Chegamos a um parque... muita gente correndo... eu corria também, corria de mim, corria do mundo, corria da minha dor... não deixei as lágrimas correrem, enguli todas. Procurei motivação... não encontrei nenhuma.

Voltei pra casa... correndo.

Eu só queria uma conversa normal com meu marido. Pensei 'talvez no banho'... mas não consegui tirar a roupa na frente dele... saí do banheiro. Não sei o que ele pensou da minha atitude.

Na verdade, não sei mais o que ele pensa.

Mais tarde, quando ele voltou do trabalho, me convidou pra fazer um passeio... ou ir à casa de meus pais.

Fui.

Tenho decidido a cada minuto levar uma vida normal... vou, volto, como, durmo, corro, faço compras, jogo fora o que não presta... tudo como uma pessoa normal, inteira. Afinal, sou uma pessoa normal e inteira.... acho.

Tenho buscado viver o hoje, o eternamente hoje... presente... embora o hoje insista o tempo todo em ser ontem.... passado... quebrado.